segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

#2 O Coração é um Caçador Solitário, Carson McCullers


Ah, esse livro. Começa pelo título. Eu nunca tinha ouvido falar dele, mas quando vi esse título pensei: “Que poético! Deve ser lindo!”. E é. Há que se reconhecer que a ideia para o nome do livro não foi da autora, mas da editora do livro. Carson McCullers queria chamá-lo O Mudo, referência a um dos personagens centrais da história (também sabemos que não existe a condição de mudo por si só; se a pessoa não fala é porque não ouve).
Bem, a história se passa no período entre a Grande Depressão e a Primeira Guerra Mundial numa cidade no sul dos Estados Unidos ainda muito marcada pelo preconceito racial e sofrendo com a crise socioeconômica. Cinco personagens principais vão sendo apresentados: John Singer (o mudo), Mick Kelly (garota de 12 anos, filha do dono da casa  em que alguns personagens alugam quartos e onde muitas cenas se desenrolam), Dr. Copeland (médico, homem negro que segue sua missão, seu propósito ao atender a população negra e acaba ele mesmo descuidando de sua saúde), Jake Blount (morador que parece estar de passagem, cheio de mensagens de cunho marxista) e Bill Brannon (dono do bar e restaurante em que muitos personagens bebem e comem e que também é palco de muitos acontecimentos dessa história).
O livro trata de alguns temas:
Solidão: ao mesmo tempo que há bastantes acontecimentos na história e interação entre os personagens, os cinco principais são extremamente solitários e parecem viver uma história à parte. Como diz Mick, eles vivem muito no mundo de dentro (o mundo dos seus próprios pensamentos) e só vivem o mundo de fora quando algo que acontece ali os afeta ou eles tem que agir sobre isso.
Ponto de vista: cada um dos cinco personagens principais tem suas teorias sobre a vida, sobre o mundo, sobre o amor, os relacionamentos, sua missão e isso fica evidente nos monólogos internos. Não necessariamente, os pontos de vista deles convergem, ao contrário.
Comunicação/O Mudo: Singer é figura central dessa história. Ele se comunica pela língua de sinais, mas seu outro amigo surdo-mudo, o grego Antonapoulos, acaba internado em uma casa para pessoas com distúrbios psiquiátricos. Ele lê lábios e escreve bilhetes para se comunicar com outros personagens, mas na maioria das vezes apenas ouve. Como ele se expressa pouco, os outros personagens todos recorrem a ela para contar suas lamúrias, pois ele é quem vai ouvir e pouco ou nada criticar ou debater. Ou seja, é uma forma de validação da visão de mundo de cada um. Eles também consideram Singer a melhor pessoa, que compartilha das mesmas ideias, o melhor amigo, enquanto Singer tem opiniões um pouco diferentes dos seus colegas. Acaba se mostrando bastante crítico de suas atitudes. Seu verdadeiro amigo é o grego.
Talvez a mensagem central seja de que é possível conviver e coexistir mesmo tendo opiniões tão contrárias sobre certas coisas; que a busca da unanimidade de opiniões seja completamente desnecessária e que a vida é um eterno exercício de tolerância, mas que isso também não deveria ser tão difícil ou doloroso. Deveria ser normal.
Os menos sensíveis ou menos atentos, digamos, dirão que o livro é sobre nada em especial, mas é aí que se enganam.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

#1 O Mundo Pós-Aniversário, Lionel Shriver


Lionel Shriver é a autora do livro que deu origem ao filme Precisamos Falar Sobre o Kevin, muito comentado quando foi lançado. Já li outros da autora e todos conservam uma semelhança no sentido de levar as relações humanas para um patamar maior, transpondo o que acontece entre duas pessoas para um patamar mais macro. O Mundo Pós-Aniversário pode ser visto como uma representação de narrativa aberta, com duas opções de curso de ação dependendo da decisão que se toma. O “talvez” e o “e se” guiam a história de Irina, Lawrence e Ramsey.
Ao propor dois possíveis caminhos e, consequentemente, desfechos, para o triângulo amoroso, Shriver sintoniza com um dos acontecimentos que mais marcaram a virada do século XX para o XXI, o ataque terrorista às torres gêmeos do World Trade Center em Nova York, em 2001. O mundo nunca mais foi o mesmo depois disso; tampouco o foi a vida de Irina, na versão da história em que ela decide deixar o companheiro, Lawrence, após 9 anos de relacionamento, para ficar com o amigo, lenda da sinuca, Ramsey Acton.
O curioso é que Ramsey é um cara meio “escroto” na versão da história em que Irina decide ficar com ele e super “gente boa” naquele em que ela resiste à atração. Por sua vez, Lawrence faz tudo de irritante que se pode imaginar na versão em que Irina não o deixa se comporta como o mais gentil e cavalheiro dos homens naquela em que leva um pé na bunda. Irônico? Proposital.
Duas versões perfeitamente entrelaçadas para vidas que poderiam ter percorrido destinos diferentes se uma outra decisão tivesse sido tomada. Lionel Shriver escreve com maestria. Excelente escolha para começar o ano lendo!

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Retrospectiva Literária 2018




Vamos a alguma organização.
Dos 50 livros que li em 2018 (um recorde para mim, sem dúvida!), temos:
31 romances
9 de psicologia e autoconhecimento
14 de autores norte-americanos
13 de autores brasileiros
7 de ingleses
24 escritos por mulheres

Entre os países das escritoras e escritores, há Suíça, Sudão, Japão, Bielorrússia, Rússia, Marrocos, Irlanda, Nigéria, Paquistão, África do Sul, Itália, Irã, Índia, Espanha e Inglaterra. Mostra que cumpri um desejo que havia estabelecido para o ano de ler escritos de países que eu não havia lido ainda. Tem alguns aí acima.
Entre os gêneros literários, além dos já citados, os mais expressivos, o restante foi extremamente pulverizado entre história, biografia, contos, crônicas, linguística, peça, crítica literária e depoimentos. Não li nada de poesia mais uma vez, não cumprindo com a intenção de incluir esse gênero nas minhas leituras de 2018.

Os livros que mais amei e/ou mais me surpreenderam (não há ordem de preferência)

A Visita Cruel do tempo, Jennifer Egan

Reparação, Ian McEwan

Voragem, Junichiro Tanizaki

As Últimas Testemunhas, Svetlana Aleksiévitch 

O Tribunal da Quinta-Feira, Michel Laub

Léxico Familiar, Natalia Ginzburg

Sting – Fora do Tom, Sting


O que quero para 2019

1.       Continuar lendo, mas não necessariamente ler cada vez mais.
Se o tempo disponível para leitura é o mesmo, perco em qualidade de leitura. Posso arrumar mais tempo para ler, mas acho que já leio bastante e quero manter esse ritmo, mas tentando ler com mais qualidade, mais atenção, anotações para me ajudar a lembrar de detalhes importantes. E talvez arrumar mais tempo para outras atividades que fico postergando, como a física, por exemplo.

2.       Comprar menos livros
Eu tenho muitos e muitos sem ler ainda, aguardando uma chance. Depois que adquiri o Kindle, uns 2 anos e meio atrás, a coisa só piorou, porque como você não vê os livros se acumulando, dá uma falsa sensação de menos culpa. Mas eles também estão lá esperando para serem lidos. Vou tentar fazer uma lista. Deve me ajudar a organizar o que ler e ter uma noção maior do acervo.
Não comprar mais é bastante difícil, porque eu tenho interesses variados e tenho muito interesse. O verbo de quem é de gêmeos é saber, e ler pra mim é saber. E ver é querer. Então, gera uma angústia. Mas estou indo relativamente bem. Janeiro acabou e não comprei nenhum (além dos dois clubes do livro que eu assino; um deles pretendo cancelar). Normalmente, eu teria comprado 2, no mínimo. De vez em quando eu faço umas doações, mas preciso fazer mais.

Esses dois desejos aí de cima já bastariam para fazer de 2019 um ano bom e produtivo de leituras, mas posso desdobrá-los em alguns mais:

3.       Ler mais clássicos
Tenho vários aguardando – russos, ingleses, brasileiros, franceses. Vou tentar intercalar com outros mais contemporâneos. Já estou lendo A Besta Humana, de Émile Zola.

4.       Ler livros fora da curva
Isso eu já faço, mas é pra não parar. Muito importante para pensar fora da caixa, sair da zona de conforto, ampliar os horizontes (literários ou não). Autores menos conhecidos, de países menos óbvios.  Necessário.

5.       Continuar escrevendo sobre os livros
Seja aqui neste blog ou em outro meio. Mesmo que poucos leiam e ninguém comente, é um exercício pra mim. E a persistência pode recompensar no final. Quando uma única pessoa me diz que se interessou pelo livro sobre o qual eu escrevi, já vale a pena. A intenção primeira é incentivar outros a lerem. Vou evitar postergar. Vou tentar escrever assim que acabo a leitura, pois tudo está fresco na memória e facilita o processo.

6.       Fazer mais anotações durante as leituras
Isso tem a ver com o item 1 e vai facilitar o item 5. Depois de um tempo, você pode voltar às anotações e pensar completamente diferente, mas ainda assim, essas anotações te ajudam a organizar as ideias sobre o livro enquanto lê ou a refletir sobre ele ao terminar a leitura.

7.       Terminar livros que estão começados
Como tenho muita coisa e tenho muitos interesses, vou lendo mais de um ao mesmo tempo. Acaba que às vezes o interesse vai diminuindo porque surgem outros e aquele livro fica abandonado por um tempo. Tem pelo menos uns dez nessa condição.

E assim espero continuar.